sábado, 8 de dezembro de 2012

ESPERANÇA... EM QUÊ ?



E pergunta-se, alguém pergunta a alguém,
 – Então pá, como vai a vida ?
E a resposta do costume, a resposta de sempre:
– Eh pá, assim, assim...
ou em alternativa:
– Menos mal, pá...
A vida vai assim, assim, para este “pá” e para a grande, para a enorme, maioria dos “pás” portugueses, o que quer dizer em mais vernáculo “a vida vai uma merda...” .
É o sentimento generalizado nas ruas de Lisboa por onde se anda, e nos cafés e pequenos restaurantes que resistem, ainda, é este o princípio de todas as conversas.
A verdade porem é que a vida vai “assim, assim...” apenas para alguns, porque para uma quantidade cada vez maior a vida não vai de maneira nenhuma.
Parou, parou no espaço e no tempo, ficou numa hibernação de esperança sem alicerces, mas ainda assim esperança, apenas porque essa é a última a morrer.
Já tudo morreu à volta, resiste teimosamente a esperança.
Esperança em nada, mas esperança.
Viver, entre humanos, quer dizer sociedade, quer dizer que se trocam palavras de ideias, de histórias, de coisas que aconteceram aos próprios ou a familiares e amigos, ou tão somente que foram vistas nos jornais ou na televisão.
Só que para isso é necessário que as pessoas (os “pás” que por aí andam) se encontrem !
E as pessoas (os pás que por aí andam) começam a não se encontrar.
As pessoas (os pás que por aí andam) começam a não sair à rua (começam a não andar por aí), e portanto deixam de ir aos tais pequenos cafés ou restaurantes que resistem (ainda) e começa, de facto já começou, a ouvir-se menos e menos o:
– Então, pá, como vai a vida ?
Ao individualismo crescente que se instalou entre nós há 30, 40 anos, sucede agora e isolacionismo.
As pessoas isolam-se, já não é um individualismo, é muito pior do que isso.
Porque individualismo é um esquema mental de vaidade desenvolvida por quem se auto define como superior e por mercê de uma febre qualquer que por aí passou, todos se começaram a julgar superiores aos restantes e individualizaram-se, convictos de que se bastavam a si próprios e cada um que se desenrascasse.
Agora trata-se do isolamento, isolamento que resulta da falta de meios, da falta de dinheiro ao menos para o passe dos transportes públicos.
E já nem sequer vale a pena referir a gasolina ou o gasóleo para o carro, porque esse, o carro, ou ficou parado na rua, uma rua qualquer, ou foi vendido rendendo uma miséria nas mãos de outro pobre que teve ali a sua oportunidadezinha de ter um carrito por uma semana, ou nas mãos de algum agiota, desses para quem esta época é de ouro.
E não havendo sequer o passe, a solução é ir ficando por casa, com a família que houver, se houver, também ela toda presa nas paredes que ainda resistem.
E neste isolamento se vão ficando os portugueses, cada vez mais, sem o emprego que faliu ou do qual foi despedido por necessidade, usura ou oportunismo do patrão, e portanto sem o dinheiro que dali resultava (é melhor pouco do que nenhum) sem capacidade de movimentação e o que é pior, sem vontade de movimentação.
É preciso passar a viver com a “vergonha” de não ter nem dinheiro para o passe, nem dinheiro para a bica, nem cara para olhar os outros humanos, muitos em idêntica situação, e muitos em isolamento crescente também.
Então o que é que fica aos que ainda assim resistem sem acabar com a vida ?
É a esperança... em nada, porque entretanto se perderam as perspetivas e os objetivos de vida, se alguma vez existiram, se perderam metas a atingir, mesmo para os nunca as tiveram mas julgavam ter, e perderam-se os interesses porque nem sequer se sabe “o interesse em quê ?”.
Fica a esperança de que “isto” passe, de que alguém apareça que resolva “isto”, habituados que fomos a que alguém resolva por nós os problemas que nunca reconhecemos serem os problemas de todos.
Alguém me falava há dias do “coletivo”...
O “coletivo” que pensa, o “coletivo” que diz, o “coletivo” que resolve.
Qual é o “coletivo” dos portugueses ?
Em Portugal só houve coletivo quando houve um inimigo comum.
Só fomos capazes de um coletivo verdadeiramente assumido quando houve um inimigo assumido.
Para destruir o inimigo, fosse ele qual fosse (Adamastor, espanhol, castelhano, mouro ou “turra”), real ou inventado, aí sempre apareceu o invencível coletivo português (ainda se lembram de Timor ?).
E agora é a Merkel... ela que se cuide.
Para construir nunca os portugueses tiveram um coletivo que não fosse por imposição absoluta, e afinal é disso que muitos estão à espera, de alguém que apareça, sabe-se lá de onde, e imponha pela força a reposição daquilo a que lhes ensinaram serem os “direitos adquiridos”, dos quais já ninguém tem a coragem de falar.
E é esta esperança que vai alimentando muito do imaginário do futuro dos “pás” portugueses.
Triste esperança, pobre esperança e, pior do que isso, indesejável esperança.
- Óh pá, quando mal nunca pior, pá...

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