Ele há dias assim que são o dia
Ferreira Fernandes
A gente diz "foi há 39 anos". Não é muito, é meia vida
de um homem. Mas foi mesmo há muito, no outro século. Pouco antes, no Abril
anterior, em 1973, cinco bracarenses estavam na casa de um deles. A PSP bateu à
porta e multou-os por não terem avisado da reunião. O 1.º Juízo da Comarca de
Braga confirmou a multa. E no jornal República, corajoso, o jornalista Vítor
Direito, tinha de escrever crónicas assim: "Manhã de nevoeiro
transforma a cidade. Não se vê um palmo em frente do nariz. Andam por aí uns
senhores a prever "boas abertas". Mas o nevoeiro persiste." E no
Porto, a comemorar o 31 de Janeiro, houve um comício no Coliseu. Um estudante
ia a meio do seu discurso quando o representante do Governo Civil (cuja
presença era obrigatória) se ergueu e disse: "O senhor cale-se!" O
estudante meteu o discurso no bolso. E ainda em Janeiro, mas em Lisboa, António
José da Glória, da tabacaria na Alameda, frente ao Técnico, disse, enquanto
servia uma cliente: "Ontem, lá houve mais bordoada entre estudantes e
polícias." Um guarda da PSP, desfardado e também cliente, logo lhe deu voz
de prisão. O sr. Glória foi a tribunal por "propagação de boatos".
Veio nos jornais. E em fins de Fevereiro, alguém escrevia, no Comarca de
Arganil: "Que aconteceu ao boateiro? Ficava bem uma lição eficaz."
Hoje é o 25 de Abril. Eu amo-o como se fosse ontem. Sobretudo por pequeninas
coisas que me recordam que antes dele foi há mais de um século.
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